Todos nós fazemos teologia. Todos possuímos nossa própria teologia de vida. Alguns tomam como ponto de partida de que o deus que tudo criou é YAHWEH, descrito na Bíblia, que enviou seu Filho Jesus para resgatar a humanidade pecadora. Outros, contudo, entendem que o mundo que vivemos não passa de uma ilusão, um universo fragmentado que deve retornar à Unidade (O Um) por meio de reencarnações. Também existem aqueles que compreendem um universo sem deus, surgido por um acaso, por motivo algum. Sim, isso também é uma teologia: a teologia do “não há Deus”!
Aos crentes da teologia ateísta o salmista dá o nome de insensatos (v.1), palavra que em hebraico tem o significado não de alguém que simplesmente não acredita em Deus porque foi mal orientada nas verdades bíblicas, mas de alguém que conscientemente decidiu viver longe dos princípios de vida ensinados por Ele.[1] Toda teologia serve de base para nosso modo de viver: atitudes morais, éticas, modo de se relacionar, de perdoar, de amar… A teologia de alguém é a sua cosmovisão, ou visão de mundo, e alguém que decidiu não olhar o mundo pela visão de Deus está certamente perdida. Por isso, o salmo 14 (que não é um lamento comum de um israelita) chama de insensato quem não acredita em Deus, pois sem uma teologia correta, nossas escolhas diárias podem ser completamente erradas.
Neste momento, alguém que se diz crente pode estar se gabando de não ser um tolo segundo as ideias do salmista, simplesmente porque está identificado na sociedade como um cristão ou como alguém que tem fé em um deus. Contudo, o autor dessa poesia não estava pensando só nos que se declaram ateus, mas também naqueles que agem como se o modo de ver o mundo e de viver sua vida estivesse pautado numa teologia incorreta, isto é, de que Deus não existe. Você pode pensar e dizer que acredita na teologia cristã, mas, ainda assim, viver uma teologia ateísta, onde todas as suas atitudes são executadas sem considerar os princípios de Cristo. Quantos cristãos não conhecemos que, ao saírem dos templos nos finais de semana, são corruptos, intolerantes, indiferentes, violentos, sem autocontrole, preconceituosos, fofoqueiros e tantas outras coisas que não condizem com uma teologia de fato cristã. Na teoria são cristãos, na prática são ateus.
Talvez alguns ateus protestem, dizendo que praticar coisas erradas não tem nenhuma ligação com a visão de um mundo sem Deus. Eu terei de concordar que muitas pessoas que não possuem uma religião promovem boas ações, mas devo explicar que minha intenção é apontar para o fato de que uma teologia de fato cristã é formada por princípios pautados na bondade, na justiça e no amor de Deus[2], o que faz com que qualquer um que de fato acredite nEle tenha atitudes que reflitam essa teologia. Contudo, uma teologia ateísta não possui um padrão ou uma fonte definida para uma moral e ética padronizadas, o que faz com que essa cosmovisão seja mais frágil e menos consistente, já que está completamente aberta e livre de princípios e doutrinas específicas.
A lição devocional do salmo, portanto, é a de que viver sem Deus (ou como se Deus não existisse) pode nos tornar pessoas perdidas, sem rumo e sem amor:
“O insensato diz no seu coração: Deus não existe. Todos se corrompem e praticam abominações; não há quem faça o bem” (v.1).
[1] KIDNER, 1980, p.95; BRUCE, 2000, p.776.
[2] É claro que isso é uma síntese muito pequena.